Peter Adler

— Claro — diz Djall — como sempre acontece com os filhos da noite. Enigmas dentro de enigmas; intriga dentro de intrigas. O fato, filho de Marcus, é que seu genitor o quer morto e eu posso protegê-lo, a despeito do motivo pelo qual eu ofereço tal proteção. Rejeite esta oferta e você terá angariado mais um inimigo ao invés de conseguir um aliado. E, nesse caso, você só poderá tentar sair de meus domínios e alcançar as terras do Inominado. Se você se decidir por este caminho, Sr. Adler, eu sugiro que use de toda sua persuasão para enganar-me, caso contrário, este cômodo será também a última coisa que você verá deste lado do Sudário.

— Sua existência é mais do que um fardo para seu sire, garoto — diz Djall — e ele não poupará esforços para tirá-lo de minhas mãos. Farei tudo o que estiver em meu alcance para protegê-lo, mas é de meu interesse que você possa fazê-lo por si mesmo, porque minhas obrigações por vezes me levam para longe da Mansão, ocasião propícia para que assassinos e espiões tentem arrebatá-lo de minhas mãos. Não tenho guarda-costas, mas assassinos e eles não são bons cães de guarda. Aqueles que forem enviados serão interceptados no meio do caminho, mas se algum deles chegar até você, é melhor que saiba como escapar de seus encantos e, principalmente, como destruí-lo.

Durante mais de meio século, Djall o treinou e foi para Peter o mestre que Marcus nunca fora capaz, ensinando a língua dos animais e como retirar da mente das pessoas a memória de sua imagem, colocando outra em seu lugar. Ele costuma dizer que existem vários dons das trevas que mexem com a mente: a capacidade de incutir pensamentos ou retirá-los; o fascínio; a capacidade de fazer ver imagens que não existem e ouvir palavras jamais pronunciadas e muitas outras. Os nosferatu desenvolveram um dom próximo ao dos ciganos, segundo Djall, só um tanto mais específico. Assim como os golpistas, os ratos conseguem iludir a mente, fazendo com que os olhos não os vejam ou, até vejam, mas sob uma aparência totalmente diferente.

Os mais antigos entre os nosferatu podem esconder-se completamente da memória de uma multidão de mentes. Documentos que comprovam sua existência são ignorados, vídeos que capturaram sua imagem são esquecidos e tais matusaléns podem desaparecer da existência, mas os efeitos de tais poderes são geralmente limitados a uma pequena parcela da população mundial de modo que o Arcano nunca pôde ser enganado, visto que eles possuem sedes em todos os cantos do planeta, nem os Nictuku nunca puderam usar esse truque para serem esquecidos.

Djall diz que esse é um bom truque, especialmente porque um bom nosferatu consegue camuflar com ele até mesmo outros sentidos, como o olfato, a audição e o tato. Entretanto, existe um dom das trevas que destrói a ilusão dos sentidos e os maiores mestres neste dom são os loucos e os magos, portanto não é uma boa idéia interagir com qualquer um deles.

Muitas outras coisas Djall ensinou a Peter, como a história do clã nosferatu e até mesmo algumas coisas sobre a história dos cainitas londrinos, sobre Mithras e seu reinado milenar que acabou na mesma noite em que Peter foi liberto do cativeiro. Portanto, ele fora uma das últimas pessoas a verem o Imperador-Deus antes do torpor.

O ancião também ensinou a ele sobre London Below e suas regras tortas. Em algum momento, quando os feiticeiros chegaram a Londres e a despeito de todos os esforços de Mithras para escorraçá-los, eles fizeram alguma coisa que tornou possível aos habitantes dos esgotos entrarem em contato com o mundo fantástico que agora os nosferatu londrinos chamam de London Below. Várias vezes durante a história de London Above os Nictuku tentaram exterminar os nosferatu, mas as fortalezas de London Below resistiu a todas.

— Aqui — diz Djall — mais importante do que os dons das trevas ou a idade, é o conhecimento sobre as regras malucas que regem este lugar e a mente dos Nictuku estão sempre tão cheias de ódio e tão focadas em nossa destruição que nelas não há lugar para tal conhecimento. Venha, vamos para London Above visitar Gwen.

— Gwenhwyfar Dämonnacht é da terceira geração de findabair — explica Djall — e os findabair são armas criadas por Marcus de Cartago há 370 anos para destruir os nictuku, mas perdemos Gwen desde a destruição do Comediante em 1985. Foi o primeiro confronto e, a partir dele, Marcus de Cartago passou a ser chamado de Marcus, o Destruidor de Nictuku. No entanto, alguns findabair foram destruídos e outros simplesmente desapareceram, como Gwen. Conseguimos encontrá-la, mas o comando que Marcus de Cartago colocara nos findabair para que eles nos obedecessem simplesmente não funciona mais e muitas crias minhas foram destruídas ao abordar o Fantasma Branco.

— Os findabair são uma linhagem nosferatu — diz Djall — A maldição de Caim, se você acredita nessas coisas, os afeta de maneira diferente do que a nós. Nem todos são deformados. Na verdade, muitos não são, mas desconcertam aqueles que os observam com uma sensação indescritível de desconforto que não desvanece mesmo quando estão “ofuscados”. Os antitribu, ou seja, aqueles findabair que fugiram ao nosso controle são ainda mais assustadores.

— Seu sangue é potente, porque só os mais antigos entre nós são capazes de criá-los — explica Djall — e, graças ao engodo de Marcus de Cartago, os mestres da Teia dos Punhais passaram para eles suas técnicas mais letais. Com muito menos do que isso os Lasombra e os Tzmisce destruíram seus patriarcas.

Peter percebe que existe algum elemento oculto nos findabair que os torna tão assustadores, um elemento que Djall está escondendo dele deliberadamente.

— De fato, se Callegari ou qualquer um que se encontra a seu soldo lhe encontrar, você será destruído — diz Djall — no entanto, isso não se deve a potência do seu sangue, mas à sua impotência. E justamente a distância que te separa do Trono Negro é o que irá lhe salvaguardar agora.